domingo, 9 de outubro de 2011

Por que mentias?

Por que mentias leviana e bela?
Se minha face pálida sentias
Queimada pela febre, e se minha vida
Tu vias desmaiar, por que mentias?

Acordei da ilusão, a sós morrendo
Sinto na mocidade as agonias.
Por tua causa desespero e morro...
Leviana sem dó, por que mentias?

Sabe Deus se te amei! sabem as noites
Essa dor que alentei, que tu nutrias!
Sabe esse pobre coração que treme
Que a esperança perdeu porque mentias!

Vê minha palidez - a febre lenta,
Esse fogo das pálpebras sombrias...
Pousa a mão no meu peito! Eu morro! eu morro!

Leviana sem dó, por que mentias?

sábado, 3 de setembro de 2011

SONETO

Já da morte o palor me cobre o rosto,
nos lábios meus o alento desfalece,
surda agonia o coração fenece,
e devora meu ser mortal desgosto!


Do leito embalde no macio encosto
tento o sono reter!...já esmorece
o corpo exausto que o repouso esquece...
eis o estado em que a mágoa me tem posto!


O adeus, o teu adeus, minha saudade,
fazem que insano do viver me prive
e tenha os olhos meus na escuridade.


Dá-me a esperança com que o ser mantive!
Volve ao amante os olhos por piedade,
olhos por quem viveu quem já não vive!

sábado, 23 de julho de 2011

Prefácio - Lira dos vinte anos

São os primeiros cantos de um pobre poeta. Desculpai-os.
As primeiras vozes do sabiá não têm a doçura dos seus cânticos de amor.
É uma lira, mas sem cordas: ( frustração amorosa)
uma primavera, mas sem flores, (juventude sem glória)
uma coroa de folhas, mas sem viço. ( símbolo do sucesso e da glória - sem verdor).
Cantos espontâneos do coração, vibrações doloridas da lira interna que agitava um sonho, notas que o vento levou, - como isso dou a lume essas harmonias.
São as páginas despedaçadas de um livro não lido...
E agora que despi a minha musa saudosa dos véus do mistério do meu amor e da minha solidão, agora que ela vai semi-nua e tímida por entre vós, derramar em vossas almas os últimos perfumes de seu coração - ó meus amigos, recebei-a no peito, e amai-a como o consolo que foi de uma alma esperançosa, que depunha fé na poesia e no amor - esses dous raios luminosos do coração de Deus.


Esse prefácio indica o pessimismo que são encontrados nos poemas da Lira dos vinte anos.

sábado, 9 de julho de 2011

A Tempestade (fragmento)

Profeta escarnecido pelas turbas
disse-lhes, rindo, adeus!
Vim adorar na serrania escura
a sombra de meu Deus!

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Tudo o mais foi um sonho:
a lua passava entre os vidros da janela aberta e batia nela:
nunca eu a vira tao pura e divina!


Noite na taverna.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

O lenço dela

Quando a primeira vez, da minha terra
deixei as noites de amoroso encanto,
a minha doce amante suspirando
volveu-me os olhos úmidos de pranto.


Um romance cantou de despedida,
mas a saudade amortecia o canto!
Lágrimas enxugou nos olhos belos...
e deu-me o lenço que molhava o pranto.


Quantos anos contudo já passaram!
Não olvido porém amor tão santo!
Guardo ainda num cofre perfumado
o lenço dela que molhava o pranto...


Nunca mais a encontrei na minha vida,
eu contudo, meu Deus, amava-a tanto!
Oh! quando eu morra estendam no meu rosto
o lenço que eu banhei também de pranto!

sábado, 28 de maio de 2011

Trindade

A vida é uma planta misteriosa
Cheia d'espinhos, negra de amarguras,
Onde só abrem duas flores puras,
- Poesia e amor...

E a mulher... é a nota suspirosa
Que treme d'alma a corda estremecida,
- É fada que nos leva além da vida
Pálidos de languor!

A poesia é a luz da mocidade
O amor é o poema dos sentidos,
A febre dos momentos não dormidos
E o sonhar da ventura...

Voltai, sonhos de amor e de saudade!
Quero ainda sentir arder-me o sangue,
Os olhos turvos, o meu peito langue
E morrer de ternura!


sábado, 30 de abril de 2011

O Poeta

Que gemer! não me enganava!
Era anjo que velava
Minha casta solidão?
São minhas noites gozadas,
As aventuras tão choradas
Que vibram meu coração?

É tarde, amores, é tarde;
Uma centelha não arde
Na cinza dos seios meus...
por ela tanto chorei,
Que mancebo morrerei...
Adeus, amores, adeus!

sábado, 19 de março de 2011

Quem sou?

Quem sou?
É difícil de dizer:
corri mundo, a cada instante mudando de nome e de vida.
Fui poeta, e como poeta cantei.
Bebi numa taverna com Bacage, ajoelhei-me na Itália sobre o túmulo de Dante, e fui à Grécia para sonhar como Byron naquele túmulo das glórias do passado.
Quem sou eu?
fui um poeta aos vinte anos,
um libertino aos trinta,
sou um vagabundo sem pátria e sem crenças aos quarenta...

Álvares de Azevedo, em Noite na taverna.

segunda-feira, 7 de março de 2011

Ai Jesus!

Ai Jesus! não vês que gemo,
que desmaio de paixão
pelos teus olhos azuis?
Que empalideço, que tremo,
que me expira o coração?
Ai Jesus!

Que por um olhar, donzela,
eu poderia morrer
dos teus olhos pela luz?
Que morte! que morte bela!
Antes seria viver!
Ai Jesus!

Que por um beijo perdido
eu de gozo morreria
Em teus níveos seios nus?
Que no oceano dum gemido
minh'alma se afogaria?
Ai Jesus!

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

No mar

Les étoiles s'allument au ciel, et la brise du soir erre doucement parmi les fleurs: rêvez, chantez et soupirez.
(George Sand)

No céu, as estrelas se iluminam e a brisa leve da noite passeia por entre as flores: sonhos, cantos e suspiros.


Era de noite - dormias,
do sonho nas melodias,
ao fresco da viração;
embalada na falua,
ao frio clarão da lua,
aos ais do meu coração!

Ah! que véu de palidez
da langue face na tez!
como teus seios revoltos
te palpitavam sonhando!
como eu cismava beijando
teus negros cabelos soltos!

Sonhavas? - eu não dormia;
A minh'alma se embebia
em tua alma pensativa!
e tremias, bela amante,
a meus beijos, semelhante
às folhas da sensitiva!

E que noite! que luar!
e que ardentias no mar!
e que perfumes no vento!
que vida que se bebia
na noite que parecia
suspirar de sentimento!

Minha rola, ó minha flor,
ó madressilva de amor!
como eras saudosa então!
como pálida sorrias
e no meu peito dormias
aos ais do meu coração!

E que noite! que luar!
como a brisa a soluçar
se desmaiava de amor!
como toda evaporava
perfumes que respirava
nas laranjeiras em flor!

Suspiravas? que suspiro!
ai que ainda me deliro
sonhando a imagem tua
ao fresco da viração,
aos ais do meu coração,
embalada na falua!

Como virgem que desmaia,
dormia a onda na praia!
tua alma de sonhos cheia
era tão pura, dormente,
como a vaga transparente
sobre seu leito de areia!

Era de noite - dormias,
do sonho nas melodias,
ao fresco da viração;
embalada na falua,
ao frio clarão da lua,
aos ais do meu coração!